As palestras e os debates no VIII Enjac Rio (Encontro de Jornalistas em Assessoria de Comunicação) enfatizaram no fim de semana, em Teresópolis, a importância da reabilitação do diploma para o exercício da profissão, além de ressaltarem o papel revolucionário das redes sociais e o compromisso com os princípios éticos da categoria, tanto no relacionamento com as fontes quanto na produção da informação.
A abertura oficial do evento se deu no sábado à noite e as palestras em quatro painéis, se realizaram no sábado, quando também foram eleitos os delegados que participarão do 17º Enjac Nacional, que acontece entre 1º e 4 de outubro na cidade de Goiânia. O VIII Enjac Rio, realização do Sindicato e da Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), teve patrocínio da Petrobras e Vale e contou com o apoio de Fetranspor, CEG Rio, Maxpress, Light e FENAJprev.
De outra geração
Em 1990, o jornalista André Machado, presente a um evento em Viena, na Áustria, enviou para a família no Brasil um cartão postal que só chegou três meses depois. Já em 2005, no Japão, ele escreveu e enviou uma matéria que foi recebida no Brasil no dia anterior. Claro que o fato de a mensagem ter “chegado antes” se deve à diferença de fuso horário. Mas ilustra bem a diferença na rapidez na recepção de uma informação na era digital da Internet sem fio.
A história foi contada de forma bem humorada pelo próprio jornalista, um dos palestrantes no painel 1 – As redes sociais como instrumento de trabalho no exercício do jornalismo. Machado, que se sente pertencente à geração X, diz que sua filha de 14 anos consegue em poucos segundos descobrir os caminhos para a manipulação de determinada ferramenta e que ele levaria horas e não conseguiria encontrar a saída. “É que ela é da geração Y”, esclarece.
Com a chegada da informação digital, a sociedade toma conhecimentos dos fatos na hora em que eles acontecem. Na opinião de Machado, jornais e revistas devem refletir sobre essas mudanças. “No dia seguinte, todo mundo já sabe de tudo. Jornais e revistas devem saber que só informação não é jornalismo. Para sobreviver, vão precisar oferecer mais disciplina, análise e contextualização. Por isso jornalismo é profissão”, enfatizou.
Em sua opinião, a Internet criou monstrengos, como a certeza da impunidade gerada pelo anonimato. Os usuários perdem a responsabilidade e tendem a se tornarem agressivos e mal educados. “Outro dia recebi um comentário grosseiro de um professor a respeito de algo que escrevi. No dia seguinte, relendo o que tinha escrito, percebeu sua reação intempestiva, resultado inconsciente do anonimato, e ligou para mim se desculpando .”
“Todos somos mídia”
É indiscutível que as redes sociais – blogues, twitter, orkut, facebock, youtube etc. – já funcionam como eficientes ferramentas na divulgação de informação, segundo Andrea Dunninghan, diretora executiva do Instituto Digital. Assessores e repórteres ganharam novas atribuições porque compartilham informações e se interrelacionam com a sociedade, clientes e leitores, sem intermediários e abertos o tempo todo a críticas e sugestões.
“O assessor fala direto com o consumidor”, enfatiza, para destacar que as pessoas participam de eventos e de lá mesmo transmitem informações e dão opinião pelas redes sociais. Andrea lembra que é preciso cuidado para trabalhar com essas ferramentas. Lembrou o caso da Pulmann que decidiu premiar com camisetas e bonés os blogueiros que enfatizassem mais a qualidade dos produtos da empresa. “Logo depois se viu que foi um erro. O caso repercutiu muito mal.”
As pesquisas demonstram a importância das redes sociais. Em período que não foi definido, as marcas mais ativas na rede tiveram aumento de receita da ordem de 18%. “Hoje, todo mundo é mídia. A pessoa diz que foi a um restaurante e viu uma barata. Se colocar na rede, a informação pode adquirir proporções de desastre para aquele restaurante”, destaca. Andrea citou também a eficiência no uso do Orkut como divulgador de marcas em comunidades do tipo “Eu adoro o produto tal”. E citou como exemplo negativo o medo que muitas empresas ainda têm de se expor na rede.
Twitter é o máximo
Criado em 2006, o twitter surgiu para responder à pergunta que costumamos fazer a familiares, amigos e colegas: “O que você está fazendo?”. A partir daí surgiu um programa em que o usuário dava resposta à pergunta no espaço máximo de 140 caracteres. Daniel Onida, da IBM Breasil, lembrou que depois o programa passou a ser difundido como uma eficiente ferramenta de uso corporativo.
Utilizado em sua maioria por usuários na faixa de idade entre 35 e 49 anos (principal) e 18 a 24 anos (secundária), o twitter vem se popularizando, embora enfrente alguns obstáculos como a dificuldade de seguir várias pessoas, durante todo o tempo, e a multiplicidade de fontes que acabam por comprometer a veracidade da informação. “Afinal, quem conta um conto aumenta um ponto”, lembra Onida. Segundo ele, o twitter também carece de estudo teórico de comunicação, a partir de sua parte operacional.
O uso do twitter já originou um vocabulário próprio, inspirado em locuções em português e até em inglês, como a expressão “twiterholic”, para designar quem faz uso excessivo da ferramenta no trabalho. Ainda existe o “egotuístico” (só fala de si), a tuitada (o post), a tuitervista (entrevista), tuincidência (coincidência em tuitar a mesma coisa), além da palavra baleia para denominar a queda do sistema, junto com as variações do verbo baleiar.
Já criou até mesmo uma nova função, a de tuiteiro. É o encarregado na empresa de acompanhar o que se tuita a respeito de determinado produto oferecido aos clientes. Trata-se ainda de uma eficiente ferramenta de venda. Segundo Onida, a Dell já vendeu 1 milhão de dólares em computadores e equipamentos. “Realmente, é um canal de vendas que fica mais positivo se integrado a outras estratégias”, acentuou.
“São todos ladrões?”
“O twitter está ultrapassado.” Depois de pronunciar a frase e assegurar que 70 etnias de índios no Brasil usam as mais variadas redes sociais para se comunicar e divulgar trabalhos e propostas, Gil Giardelli, sócio fundador da Permission Inteligência Digital, disse que as inovações na área digital superam todas as expectativas sobre as possibilidades de relacionamento entre as pessoas em todo o mundo.
Para provar que “as pessoas seguem pessoas e não seguem empresas”, Giardelli lembrou que no twitter 3.800 pessoas seguem a Dell e 13 mil a Ford. Já o número dos seguidores de Al Gore, que perdeu as eleições presidenciais para George W. Bush em uma eleição marcada por verossímeis denúncias de fraudes, ultrapassa a casa de 1,5 milhão. Ele aproveitou para lamentar o fato de que no Brasil cerca de 1 milhão sigam o técnico Mano Menezes, do Coríntians, e somente 13 mil sigam o movimento “Fora Sarney”.
Em uma palestra marcada pelo futurismo e o surgimento de uma nova era, em que “cada ser humano é agente de mudança política”, Giardelli disse que a Internet multiplica a cada dia as possibilidades de criatividade e interatividade entre as pessoas em todos os continentes. Para ele, todas as formas de comunicação devem ser repensadas. “Hoje, é preciso saber que a meta não é vender jornal; a meta é vender informação”, disse. Lembrou a história do dono de carroças puxadas a cavalo, que faliu por não entender que seu negócio era transporte de pessoas e não administrar veículos movidos à tração animal.
Para demonstrar essa nova realidade, lembrou que Barack Obama, antes de ser candidato, já administrava um perfil no Facebook com mais de 1 milhão de amigos, além de participar em 80 redes sociais com a presença de 4,5 milhões de negros e 3 milhões de latinos. Mas tem gente que despreza esse potencial. Recentemente, um empresário brasileiro se recusou a dar entrevista para o blogue da revista Exame. “Sabe por quê? Ele não sabia que o blogue é quatro vezes mais visto/lido do que a revista.”
Para mostrar a dimensão extraordinária da influência das redes, disse que 350 milhões de internautas em todo o mundo baixam música sem pagar um tostão por isso. “São todos ladrões, e eu me incluo nesse rol. Mas quem está errado? Esses ou as empresas que tentam evitar o acesso livre a essas músicas?”, perguntou sem dar a resposta. Citou ainda as iniciativas criativas que dão uma dimensão extraordinária às redes sociais, entre as quais a da Zappos que permite em seu buscador que o cliente tenha acesso às promoções dos concorrentes, e do site “enjoeitovendendo” que no próprio nome dá o seu recado.
Sigilo para bandido?
Após fazer um hiistórico sobre a luta pela regulamentação profissional, o presidente da Fenaj, Sergio Murillo, disse que os empresários de comunicação sempre se posicionaram contrários à regulamentação e a função de assessor de imprensa era vista com muito preconceito. “Na legislação que regulamentou a profissão de jornalista não consta a função entre as várias reconhecidas – diagramador, redator, repórter fotográfico, revisor etc.”, listou Murillo, em sua palestra no painel 3 – A queda do diploma. O que muda ou nada muda?
Para Sergio Murillo, uma das consequências da decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de acabar com a obrigatoriedade do diploma de Jornalismo para exercer a profissão está relacionada com o perigo de escancarar o acesso à profissão a qualquer pessoa porque a legislação beneficia o jornalista no direito de manter o sigilo da fonte.
“A partir do acórdão relacionado com a decisão do STF, abre-se a possibilidade de um bandido usar prerrogativas da profissão para se livrar de uma condenação. Por esse motivo, temos a obrigação de dar uma resposta à decisão estúpida e irresponsável do STF”, observou Murillo, antes de afirmar que o melhor caminho é deixar que o Congresso Nacional resolva a questão. Citou as propostas de emenda constitucional (PEC) e a Frente Parlamentar em Defesa do Diploma como instrumentos importantes para fortalecer a luta dos jornalistas.
A 1ª Conferência Nacional de Comunicação, que será realizada entre 1º e 3 de dezembro, em Brasília, deve ser vista como um espaço importante para que a exigência do diploma seja debatida como um elemento central e estratégico para a consolidação democrática brasileira. “Liberdade de imprensa e de expressão é patrimônio do cidadão diante do poder político e não dos patrões ou dos jornalistas. Trata-se de uma grave deturpação citar a obrigatoriedade do diploma como exigência da liberdade de expressão”, criticou.
O caminho das PECs
No mesmo painel, Claudismar Zupiroli, advogado da Fenaj, lembrou que a decisão que derrubou a exigência do diploma foi tomada em 2001, quando a Justiça de São Paulo concedeu liminar a favor do recurso impetrado pela entidade que representa as empresas rádio de televisão no estado. “Em 17 de junho deste ano, o STF apenas manteve aquela decisão”, destacou. Zupiroli, que vê na proposta de emenda constitucional o caminho mais eficiente para o resgate da obrigatoriedade do diploma.
Embora o meio empresarial, de maneira geral, seja contrário ao diploma, há os que vejam nos jornalistas os profissionais mais preparados e habilitados para trabalhar na produção de conteúdo das redes sociais. “O jornalista tem mais condição técnica e intelectual para dar as respostas. Só quem trabalhou em redação sabe exatamente como pensa o outro lado. Nesses casos, o jornalista pode ser o gerente de conteúdo, o cara que pensa”, opinou Luiz Roberto Serrano, presidente do Sindicato das Empresas de Comunicação (Sinco), que já trabalhou como jornalista em revistas como Veja e IstoÉ.
Ele criticou o que considera dependência do jornalismo às informações geradas pelas assessorias de imprensa. Em sua opinião, isso se deve à precarização do trabalho na imprensa, que dispõe de menos gente e equipamentos para produzir informação independente. “Sem assessoria de imprensa, 50% da informação não existiria”, garantiu. A respeito da decisão do STF sobre o diploma, disse que os ministros que votaram a favor “confundiram liberdade de expressão com liberdade de imprensa”.
http://www.jornalistas.org.br/ler_imprensa.asp?id=1378
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